Refis da Crise - exclusão de contribuinte por meio eletrônico.

Refis da Crise - exclusão de contribuinte por meio eletrônico.




Sobre o autor:

J. Marcello M. Gurgel.

Bacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e Mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Advogado e Professor de Direito Financeiro e Tributário do Centro Universitário Estácio da Bahia, Universo/Salvador e da Unyahna/Salvador.



A Lei n.º 11.941/2009 instituiu novo parcelamento de débitos tributários federais na seqüência dos parcelamentos anteriores, parcelamentos que se apresentam como “amortecedores” da altíssima carga tributária do país (ao redor de 38% do PIB).

Diante do cenário econômico mundial à época da referida Lei n.º 11.941/2009, esta se tornou conhecida como o “Refis da Crise”.

Interessante notar a omissão no referido diploma legal quanto à exclusão dos contribuintes do referido programa de refinanciamento fiscal. De fato, tal situação só foi “contornada” com o advento da Portaria PGFN/RFB n.º 6/2009, pois seu artigo 21, §4.º, além de estabelecer alguns parâmetros para exclusão, “criou” a modalidade de exclusão por meio da comunicação eletrônica.

Em sendo assim, a Portaria PGFN/RFB n.º 6/2009 (ato secundário e regulatório) “inovou” ao “criar”, dentro do Estado Democrático de Direito, sempre delineado pela LEI (ato primário e regulador), a tal modalidade de exclusão por meio da comunicação eletrônica.

O Conselho Gestor, ao exarar tal portaria, o fez sem qualquer amparo legal (ainda que vinculado aos ditames da referida Lei n.º 11.941/2009 - “Refis da Crise”) e sem observar, portanto e ao menos, os mandamentos da Ampla Defesa e Contraditório (artigo 5.º, LV, da Constituição Federal), ou mesmo as diretrizes dos artigos 26 a 28, da Lei n.º 9.784/1999 (Lei Geral do Procedimento Federal).

Tal situação foi observada pela doutrina conforme se verifica, v.g: “o contribuinte devedor deverá ser intimado para, querendo, apresentar defesa, por força do que dispõe o princípio da ampla defesa, albergado expressamente no art. 5.º, LV da CF e no art. 2.º da Lei n.º 9.784/1999. (...) A intimação deverá obedecer ao disposto nos arts. 26 a 28 da Lei nº 9.784/1999. Quanto ao prazo da defesa, deverá ser aplicada por analogia a norma do art. 25 da mesma Lei, facultando-se ao contribuinte acusado o prazo de cinco dias para se defender da representação referenciada.” (PIMENTA, Paulo Roberto Lyrio. Exclusão do Refis. In: VERGUEIRO, Guilherme Von Müller Lessa (Coord.). REFIS: Aspectos Jurídicos Relevantes. Bauru, SP: EDIPRO, 2001, p. 370).

Torna-se necessário, portanto, imprimir ao Conselho Gestor e a tal Portaria PGFN/RFB n.º 6/2009 (ato secundário e regulatório, repita-se), obediência aos ditames legais (atos primários e reguladores) então ignorados, como ensina Geraldo Ataliba: “Via de conseqüência, mesmo normas jurídicas solenes – como é o caso dos regulamentos, veiculados por decretos do presidente da república, por força de uma competência especial e privativa, prevista no texto constitucional – somente são obrigatórias na medida em que rigorosamente fiéis aos textos legais. Por essa razão os regulamentos não obrigam ordinariamente, a não ser os servidores públicos hierarquicamente subordinados ao chefe do Executivo. Para os cidadãos, em geral, o regulamento só obriga se integralmente apoiados em lei seus preceitos.” (ATALIBA, Geraldo. “República e Constituição”. 2.ª ed., São Paulo: Malheiros, 2007, p. 126).

Ainda que o entendimento do Superior Tribunal de Justiça tenha permitido a utilização do meio eletrônico, conforme Enunciado Sumular n.º 355, a “palavra final” sobre a vexata quaestio será decidida pelo Colendo Supremo Tribunal Federal, sob pena de usurpação da competência reservada ao mesmo, tendo em vista a notória inobservância do Conselho Gestor, e malfadada Portaria PGFN/RFB n.º 6/2009, aos princípios constitucionais do devido processo legal (ampla defesa e contraditório) bem como às garantias estabelecidas no artigo 37, da Constituição Federal.

Não por outra razão novo viés “toma corpo” nos Tribunais Regionais Federais em defesa do Estado Democrático de Direito e suas garantias constitucionais, senão vejamos: “PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. EXCLUSÃO DO PROGRAMA REFIS. LEI 9.964/2000. RESOLUÇÃO CG/REFIS 20 DE 2001. INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA PELO PLENÁRIO DO TRF DA 1ª REGIÃO. VINCULAÇÃO. CIENTIFICAÇÃO DOS ATOS PRATICADOS PELO COMITÊ. 1. (...) 2. (...). 3. O STJ, na edição da Súmula 355, analisou a controvérsia sob o enfoque da forma de notificação do ato de exclusão do Programa de Recuperação Fiscal - REFIS e assentou a validade da sua concretização pelo Diário Oficial ou pela internet. 4. No julgamento desta Corte, o exame da controvérsia ficou centrado na inobservância aos princípios do devido processo legal, ampla defesa e contraditório, bem como às garantias estabelecidas no art. 37 da CF/1988, decorrente da falta de intimação prévia do contribuinte quanto ao ato de exclusão. 5. (...) 6. Apelação a que se dá provimento.” (Tribunal Regional Federal da 1.ª Região, AC 0034623-03.2006.4.01.3400/DF, Rel. Desembargadora Federal Maria Do Carmo Cardoso, Oitava Turma, e-DJF1 p.283 de 26/11/2010).

A Des.ª do E. Tribunal Regional Federal da 1.ª Região, Maria do Carmo Cardoso, em julgamento semelhante, já alertava que: “O ato de exclusão é medida administrativa de caráter sancionatório, que impõe penalidades ao contribuinte, sem a opção prévia de oferecer o contraponto necessário, aviltando o devido processo legal consagrado na Constituição Federal.” (TRF – 1.ª Região, voto proferido nos autos da Argüição de Inconstitucionalidade n.º 2007.34.00.022211-3/DF, 21.11.2008).

Não por outras razões, a exclusão por meio eletrônico nos moldes da Portaria PGFN/RFB n.º 6/2009 é nitidamente inconstitucional, e sustentar o contrário é verdadeira desconstrução do Estado Democrático de Direito e dos mais comezinhos princípios constitucionais.


..................................

 
Caro leitor,

“Refis da Crise – exclusão de contribuinte por meio eletrônico.” de J. Marcello M. Gurgel esta publicado na 6ª Edição da Revista DIREITOS.

0 comentários: